Certa feita assisti às manifestações populares por ocasião do "día de los muertos" na Bolívia. Ao contrário do Brasil, onde uma simples visita ao túmulo familiar - e ocasionalmente, a participação numa missa - compõe o quadro do feriado antes da cerveja e do cochilo à tarde, lá os rituais são muito mais elaborados.
As mulheres se cobrem de vestes negras e longas como suas tranças ou seus imensos rosários. Os homens, quando não envergam paletó, fecham o colarinho e abotoam suas camisas até o punho. Mais que tudo, seus semblantes parecem fechados como suas almas, numa introspecção severa, mas serena.
As visitas aos campos santos se dão em procissão e os sacerdotes repetem ladainhas em castelhano enquanto seus auxiliares manuseiam matracas como as de antigamente no sertão nordestino. O povo carrega fotos de seus mortos e, apesar das feições andinas de seus protagonistas, são tantos os símbolos católicos que parecemos assistir a manifestações ibéricas ou itálicas de outros séculos. Para mim, foi como uma viagem de encontro com antepassados e seus esquecidos costumes, justamente no dia dedicado a memória dos que já passsaram.
Às celebações católicas e européias, no entanto, os filhos dos incas somam os ritos da winiapacha, na qual oferendas de todos os tipos aguardam a descida dos espíritos ancestrais, desde pães especiais até folhas de coca. E os túmulos, tal qual terreiros de candomblé, são ornados com as ofertas, enquanto os homens e mulheres que este estrangeiro pensava irremediavelmente tristes seguem alegres até as suas casas, para esperar os sinais da presença de seus mortos, cuja visita celebrarão.
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